2009-02-11

Pinturas e Fantasias Indianas


Na Índia tive às vezes a sensação que bastava estar atento para vermos um mundo muito diferente da Europa, quase que não era preciso andar à procura da novidade. Tal não se passa em relação à pintura que tem uma presença bastante discreta.


O Islão desencoraja a representação de figuras humanas e de animais, o que criou dificuldades ao desenvolvimento da pintura indiana. As pinturas mais antigas, anteriores à chegada do Islão, têm dificuldade em manter-se nos ambientes quentes e húmidos predominantes na Ìndia.

Ficam assim as miniaturas, de dimensão apropriada para inserir em livros, influenciadas inicialmente pelas obras persas, divergindo posteriormente de acordo com várias escolas, não existindo uma unidade indiana neste domínio.

Julgo que as pinturas que apresento a seguir são predominantemente do Rajastão, algumas são scans de postais ilustrados que comprei lá, outras são scans de ilustrações da edição do Kamasutra que não resisti a comprar na Índia.

Boa parte das pinturas executadas no tempo dos grão-mogóis não era assinada nem datada e esse hábito perdura nos postais ilustrados que vendem aos turistas nos hotéis, pelo que tenho que tentar fazer uma classificação das imagens deste post guiado pela intuição.

Nesta figura aqui ao lado mostro um homem azul, é um hábito indiano assinalar as figuras míticas com uma cor de pele azul ou cinzenta, para os distinguir dos comuns mortais. Talvez seja daí que vem a expressão "de sangue azul"...

A figura parece-me uma estilização moderna de um estilo antigo, mantendo as posições dos corpos, os olhos que parecem uma solução intermédia entre a posição frontal dos egípcios e uma verdadeira forma de perfil, a cor azul da pele. Do lado moderno está a simplicidade do traço e a ausência de pormenores decorativos, sempre presentes nas imagens mais antigas.

O tom azul da pele, juntamente com o dhoti amarelo (pano rectangular enrolado e com nó à volta da cintura, parecendo uma saia) e coroa com motivos de pavão indica que se deve tratar de Krishna que estaria então acompanhado por Radha.











A imagem aqui à direita já me parece mais tradicional, com uma muito maior quantidade de detalhes, parecendo representar também o casal Krishna - Radha num pavilhão dum jardim, com muitos pavões (ave nacional da Índia) na copa das árvores no horizonte, com umas damas a acolitar o casal pois numa sociedade com tantas mordomias podia surgir alguma necessidade de um serviço de última hora








Na figura seguinte mostro uma miniatura que me parece mais sofisticada do que a anterior e em que, mais uma vez, o casal não está sozinho. Trata-se de uma príncipe assistindo a um “mujra” (uma dança, segundo a wikipédia) das suas consortes, com uma representação interessante dos embutidos nos painéis de mármore das paredes do palácio.




A figura seguinte, com as damas tomando banho num lago coberto de flores tem um traço que faz lembrar as figuras do José Vilhena e será provavelmente uma reinterpretação contemporânea, apimentada, de alguma figura mais antiga, mantendo contudo uma inspiração claramente indiana em muitos detalhes, nomeadamente na forma quase-esférica da representação dos seios.

Achei muito curiosa esta fantasia indiana de um cavaleiro entrar num lago perfumado com flores de nenúfar, em cima do seu cavalo. Parece do mais elementar bom senso que depois do banho do cavalo o lago não ficará em boas condições para tomar banho, mas os príncipes chamariam o seu exército de serviçais para voltar a ficar tudo limpinho outra vez.

Acho também curiosa a auréola à volta da cabeça do príncipe, não se trata de assinalar um santo mas uma pessoa importante. Na Índia as pessoas importantes são envoltas numa auréola.




Do livro do Kamasutra seleccionei esta fantasia curiosa da junção da actividade da caça ao acto sexual, com os cavalinhos nas proximidades. O estilo é muito naif e o tigre parece estar a arrancar a seta que lhe espetaram na cabeça com uma garra que parece ter um polegar oponível:




Para rematar o mundo da fantasia reservei esta cena surreal em que o príncipe além de manter uma relação com uma das esposas sobre a sela do cavalo, enquanto persegue a galope alguns veados, ainda espeta uma lança num búfalo. É acompanhado pelas consortes cavalgando mais ao pé e pelos amigos num plano mais longínquo, em cima de elefantes. Não tinha ideia que tratavam os búfalos assim na Índia. E afinal não são só as mulheres que conseguem fazer muitas coisas ao mesmo tempo...

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